Sem uma dose cavalar de saudosismo fica difícil para os amantes das artes deslumbrar-se, hoje, com o que se poderia chamar de esteticamente correto ou culturalmente apreciável. Por isso entendo alguns críticos impiedosos (malditos sejam!) e irmãos de conjuntura dos anos 60, início de nossa adolescência, quando sentenciam: "Roberto Carlos morreu" ou "nossa literatura tornou-se orfã após a morte de Drummond".
Certo, o "rei" está nú, a poesia tropeçou e caiu com a morte de Drummond (e de Cecília, João Cabral, Quintana, Coralina), mas se vamos "beber o corpo" esquálido dos derradeiros cadáveres, que seja um velório coletivo, porque nossa orfandade atravessa o deserto da literatura, passa pelo teatro e pela televisão, embrenha-se na espessa mata da produção musical e atola-se no lamacento charco da política.
Claro, os mecenas ainda saltitam aqui e ali, mas longe da inteligência morena e do viço tupiniquim e coladinhos à palidez dos mortos-vivos. Na música, por exemplo, desde os explosivos festivais ao fim dos anos 80, quem viveu e viu não tem mais ouvidos disponíveis para o que se produz atualmente, principalmente na Bahia.
O que os "velhos guerreiros" de voz e violão (ainda) produzem nem de longe merece o que "pariram" nos velhos tempos. O resto é lá-lá-la, ôôô, salvo alguns poucos esforçados que tentam recuperar o oásis perdido.
Para os amantes dos bons livros, qualquer biblioteca moderna é um corredor tortuoso para uma difícil escolha. Claro, eles existem, apesar dos 100 milhões de auto-ajuda vendidos pelo alquimista (sem pedra filosofal) a leitores sequiosos (a maioria, no mundo) de que lhe apontem um norte além de seu tapa-olho cultural e espiritual.
E nós que já tivemos um Graciliano, um Machado de Assis, um Guimarães Rosa, hoje temos livros, não à "mão cheia" e não somente no Brasil, porque a literatura mundial também tornou-se tola e estéril. Nas vitrines das livrarias, hoje, predominam peças como "Seja um empresário de sucesso" ou "Como criar seus filhos adolescentes", e tolices do ramo.
Mas a mediocridade nacional se configura em sua plenitude é na televisão. Depois de Dias Gomes, por exemplo, a dramaturgia brasileira praticamente esbarrou na sordidez e nas mesmices dos noveleiros bem pagos para escrever imbecilidades televisivas. E quando há um seriado extraído de obras literárias, vai para o corujão da madrugada, porque horário nobre é para idiotas verem as mesmas caras cansadas falando as mesmas porcarias.
E os programas de humor que ainda resistem só não fazem rir, porque são mal-escritos e de péssimo gosto. Mas como mensurar o crescimento cultural de um país onde grande parte de seus políticos fazem do Congresso Nacional um "aparelho" tão inexpressivo? Será que vamos passar gerações e mais gerações somente lembrando de Juscelino? Bem, pelo menos ele morreu, de "morte morrida", já nada se pode cobrar dele, só admirar os exemplos. Pior são os que aí estão, que também "morreram" mas continuam "vivos", o que me lembra velha frase de quem não conheço o autor: "É melhor morrer do que perder a vida"..