sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

PAC promove carnaval de bilhões.

Por Cláudio Leal. Transcrito do terra magazine
Levada em conta a avalanche de anúncios e discursos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), o governo federal ultrapassou em mais de R$ 100 bilhões a meta inicial de investir R$ 503,9 bi no País, segundo a checagem mais elementar, a partir de anúncios do próprio presidente e/ou seus ministros.
Uma rápida leitura dos anúncios em jornais e revistas feita por Terra Magazine sugere alguma semelhança entre a euforia bilionária e a virgindade da cantora Britney Spears - uma jogada de marketing, segundo os especialistas em virgindade de Britney Spears.
Em 22 de janeiro de 2007, o presidente Lula disparou o PAC com a perspectiva de R$ 503,9 bi em investimentos até 2010. Da Transposição do São Francisco ao elevador panorâmico da favela Pavão-Pavãozinho, o País viraria um "canteiro de obras".
Barreiras ecológicas e financeiras à parte, o PAC contagia governadores, prefeitos, vereadores, quiçá quiromantes, a sustentarem números quilométricos com a modéstia de quem dá uma gorjeta. O Brasil virou um país auto-suficiente em bilhões.
Parte das obras alardeadas vem de promessas do governo anterior. Os rudimentos desse espetáculo de bilhões podem ser encontrados no programa "Avança Brasil", de Fernando Henrique Cardoso, lançado em 1999.
O PSDB usou o mesmo slogan da campanha presidencial de FHC e fez brotar altas cifras - para nada. Ainda se ouve o eco: R$8 bilhões de reais em agricultura, R$22,7 bilhões em transportes... Avança Brasil.

Sinergia na veia
No lançamento do PAC, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, apontou uma "sinergia entre o investimento público e o investimento privado". Esclareceu mais:
- E quais são os eixos? São infra-estrutura logística, infra-estrutura energética e infra-estrutura social e urbana.
"O PAC é dinheiro público direto na veia", declarou Dilma em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, em janeiro. A frase trazia embutida a overdose numérica. Os bilhões passaram a pulular na mídia:
- A área de logística receberá investimentos de R$58,3 bi.
- Os investimentos em energia serão da ordem de R$ 274,8 bi.
- Para a infra-estrutura "social", 170,8 bi em quatro anos.
Um instante, maestro. Somados apenas esses três anúncios - investimentos em infra-estrutura, energia e logística -, a conta fecha: R$503,9 bi.
Sopa de anúncios
A facilidade pára aqui. Sem demora, os discursos oficiais trataram de pulverizar as previsões de gastos e promover um carnaval de projetos e contradições. Deu em samba.
Entre a megalomania e a realidade, transitam os bilhões do PAC. Embaixo do mesmo guarda-chuva, são incluídos gastos previstos desde os tempos do idílico romance de Caramuru com a índia Catarina Paraguaçu.
A seguir, uma sopa de manchetes e notas sobre o programa federal. Esqueçam os milhões. Valores mais altos se levantam.
Metroviários de Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte e São Paulo, uni-vos: as obras dos metrôs das referidas cidades receberão R$ 3,1 bi. (22/1/2007)
O PAC destina R$24,1 bi para incrementar economia do Centro-Oeste (3/5).
Lula: São Paulo deve ter R$5 bi para saneamento. (Salvemos as represas Billings e Guarapiranga. Erradicadas as palafitas da Baixada Santista. Água para Diadema).
"PAC injeta R$ 7,35 bilhões em moradia e saneamento em SP" - segundo o ministro das Cidades, Márcio Fortes. (27/6)
A Petrobrás entrará com R$144 bi no PAC. (22/7)
Curto prazo, até 2010...
Brasil bucólico: em junho, o ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, palmilhou as cidades banhadas pelo Rio São Francisco. Provou da água da nascente. Reuniu-se com prefeitos em seu terreiro eleitoral, a Bahia. O sofrimento da caminhada exigiu um anúncio polpudo: R$ 6,6 bi para a Transposição.
Geração e transmissão de energia terão R$2,5 bilhões no PAC Federal. (Nota de rodapé: somente no Paraná, segundo o presidente Lula e o governador Roberto Requião).
Bendito Paraná. Terá R$4,75 bi do PAC para refino, petroquímica e processamento de óleos vegetais.
Até aqui, como diria o sábio Stanislaw Ponte Preta, está dando mais bilhões do que "cará no brejo". Se as cifras fatigam, caro leitor ou leitora, desista. A fúria numérica não cessa.
Isoladamente, os bilhões nada dizem. É preciso complementá-los: até 2010, em quatro anos, a curto prazo, a longo prazo, antes do fim do mandato.
PAC para todos
Insatisfeitos com a centralização dos "bilhões até 2010" no gabinete de Dilma Rousseff, os ministros partiram para os anúncios dos PACs setoriais.
Em julho, o ministro Hélio Costa vislumbrou o "PAC da Comunicação". E detalhou uma de suas propostas para a aceleração do crescimento:
"Ainda na área dos Correios, o ministro disse que o projeto deverá trazer uma proposta em relação a remessas de valores feitas por brasileiros que vivem no exterior. Segundo Hélio Costa, essas remessas atingem até R$ 6 bilhões e chegam via bancos estrangeiros e particulares, um serviço que poderia ser feito pelos Correios." (Agência Brasil, 2/7).
Como ninguém havia pensado nisso antes? Aos números, rápido.

Bandalargar os bilhões
"PAC Funasa terá R$ 4 bilhões para saneamento, anuncia Lula" (20/9). A Fundação Nacional de Saúde priorizará as cidades com índices mais elevados de mortalidade infantil, malária, doença de Chagas e outros males da nacionalidade.
Para universalizar a internet banda larga, "em até 3 anos", serão necessários R$ 2,5 bi (14/11). Há jornais que anunciam R$3 bi, mas, evidentemente, cerca de R$500 milhões somem a caminho da mercearia.
Crise aérea? O governo anuncia R$ 3 bi para o PAC do setor aeroportuário nacional. Em 26 de julho, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, comunica um remanejamento de R$2 bi para desatar os nós da aviação.
Para a glória dos aviões de carreira, uma repórter registra: "Com o remanejamento, o valor total destinado a conter a crise aérea somará R$ 5 bilhões".
Em 4 de abril, num jantar com senadores do PT, Lula já confessara a intenção de criar o PAC das Forças Armadas - para valorizar a Marinha, o Exército e a Aeronáutica. Na certa, para garantir também a integridade do vindouro PAC do Turismo - no popular conhecido como o PAC Relaxe e Goze.
Há ainda o "PAC da Cultura". Em 4 de outubro, Lula e o ministro Gilberto Gil lançaram o Programa Mais Cultura: R$ 4,7 bi (claro, até 2010). Lula anuncia R$ 41 bilhões para PAC de Ciência e Tecnologia (23/11).
Hora da razão
Em 8 de novembro, um intervalo para o repórter Leandro Kleber, do Contas Abertas, analisar a distância entre a propaganda e as obras:
"Dos R$ 15,2 bilhões autorizados para serem gastos este ano com as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), apenas R$ 4,4 bilhões foram efetivamente aplicados - incluindo o pagamento de ações iniciadas no ano passado - o que equivale a uma execução inferior a 30%".
Ele prossegue:
"(...) das 740 ações que integram o PAC, quase 50%, exatamente 345 ainda não receberam nenhum centavo dos cofres da União (tanto em empenhos, quanto em pagamentos). O orçamento autorizado dessas ações que ainda não saíram do papel ultrapassa os R$ 5 bilhões".
Argumentos contraceptivos não impediram o nascimento de mais um PAC. Na quarta-feira, 5 de dezembro, surgiu o PAC da Saúde, sob as graças do ministro José Gomes Temporão. Investimentos de R$ 88,6 bilhões "até 2011". A Folha de S. Paulo destrincha: "R$64,6 bi são recursos velhos
".
Uma semana antes, no Espírito Santo, o presidente Lula prometia: "Vamos fazer definitivamente uma revolução na saúde neste país".
Somando a banda larga, o PAC da Cultura, o PAC da Saúde e o PAC de Ciência e Tecnologia, temos R$136 bilhões de investimentos até...
Certamente, faltará bilhão ao PAC. Jorrará, talvez, da reserva petrolífera de Tupi, na Bacia de Santos.