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segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Carta aberta do BC

Por Alexandre Schwartsman.

Folha de SP

Pusilânime

Há alguns anos, 2008 ou 2009, não me lembro bem, estive na Argentina com um amigo para visitar autoridades e economistas locais. Na ocasião, no jantar com um destes economistas, meu amigo perguntou sua opinião sobre o então presidente do BCRA, Martin Redrado. Ele suspirou, olhou para nós e, caprichando no insuperável sotaque portenho, confidenciou: “Martiiiin… ¡Martin es un pusilánime!”.

Não pude deixar de me lembrar disto ao ler a Carta Aberta do presidente do nosso BC ao ministro da Fazenda, explicando as razões pelo estouro espetacular da meta de inflação (10,7% contra 4,5%, muito além dos dois pontos percentuais de tolerância). Aqueles com paciência para encarar 5 páginas e 38 parágrafos do que, em meu tempo de escola, era conhecido como “encher linguiça” podem até ficar com pena da atual diretoria do BC, que se coloca como impotente e surpresa face ao choque inflacionário, mas, se for o caso, terão sido devidamente enrolados.

Arte de CAZO


A narrativa do BC é a mesma desde 2014: a inflação refletiria dois processos de mudança de preços relativos, isto é, o ajuste dos preços administrados (como energia ou combustíveis) vis-à-vis preços livres, assim como a elevação dos preços de bens afetados pelo dólar (normalmente exportados e importados) em comparação àqueles cujo preço depende essencialmente das condições domésticas (tipicamente, mas não apenas, serviços).

Em face destes choques, caberia ao BC apenas evitar sua propagação aos demais preços, por exemplo, reduzindo a demanda para que empresas não repassassem integralmente o aumento das tarifas de energia sobre o preço dos seus produtos, ou o custo das matérias-primas importadas.

Arte de AMARILDO


Ao atribuir a culpa pela inflação de 2015 aos preços administrados, porém, o BC deixa de lado algumas informações importantes. Em primeiro lugar deveria reconhecer que tanto em 2013 como em 2014 a inflação só se manteve dentro dos limites de tolerância graças à prática (irresponsável) de contenção artificial dos preços públicos. Sua negligência inicial no trato com a inflação se encontra, portanto, na raiz da política de controle de preços entre 2012 e 2014 e, por consequência, da necessidade do ajuste em 2015.

Já no que se refere ao efeito do dólar, vale praticamente o mesmo ponto. O BC, por meio de suas intervenções, represou o ajuste da moeda e é, ao menos em parte, responsável pelo forte desvalorização do real no ano passado.

Arte de LUSCAR


…Trata-se, enfim, de um documento pusilânime, em que o BC foge da responsabilidade pelo problema que criou. Que use de mais coragem na Carta do ano que vem.

É verdade, reconheço, que o dólar saltou de patamar após o infeliz anúncio do orçamento para 2016 e dos sinais cada vez mais claros da incapacidade do governo no que se refere ao controle de seus gastos.

No entanto, enquanto agora o BC culpa o desempenho fiscal, em todas suas manifestações oficiais anteriores afirmara que “no horizonte relevante para a política monetária, o balanço do setor público tende a se deslocar para a zona de neutralidade e não [se] descarta a hipótese de migração para a zona de contenção”, ou seja, sem maiores críticas à política fiscal, muito ao contrário. Hipocrisia pode ser a homenagem que o vício presta à virtude, mas um pouco mais de sutileza não faria falta.

Arte de SPONHOLZ


Trata-se, enfim, de um documento pusilânime, em que o BC foge da responsabilidade pelo problema que criou. Que use de mais coragem na Carta do ano que vem.

terça-feira, 22 de setembro de 2015

Congresso cobra cortes mas aumenta despesas

Fonte Congresso em Foco

Charges de ALPINO

Congresso cobra cortes do governo, mas cria despesas que anulam cortes
Os presidentes da Câmara e do Senado e lideranças da oposição têm cobrado do governo federal mais corte nas despesas em vez de aumento de tributos para reequilibrar as contas públicas. Reportagem da Folha de S.Paulo mostra que o próprio Congresso aprovou em 2015 projetos que, se entrarem em vigor, vão elevar em R$ 22 bilhões por ano os gastos anuais. O valor se aproxima dos R$ 26 bilhões em cortes pretendidos no pacote anunciado na semana passada pela equipe econômica.




Três das propostas aprovadas que aumentam os gastos públicos estão na pauta do Congresso desta terça-feira (22), convocada para examinar vetos presidenciais. A derrubada de uma decisão da presidente precisa ter o apoio de pelo menos 257 dos 513 deputados e de 41 dos 81 senadores.

Um dos principais temores do Executivo é a derrubada do veto que barrou o reajuste salarial médio de 59,5% aos servidores do Judiciário nos próximos quatro anos. O impacto previsto sobre as contas públicas é de R$ 25,7 bilhões até 2018, e de R$ 10 bilhões por ano daí em diante.



Outros dois vetos da pauta-bomba preocupam o Palácio do Planalto. O receio é que os parlamentares retomem a proposta que cria alternativa ao chamado fator previdenciário, mecanismo que reduz o valor de aposentadorias precoces, e a que equipara o reajuste dos aposentados ao do salário mínimo. Só esta medida acarreta custo extra de R$ 135 bilhões até 2030, segundo o Ministério da Previdência Social.

Em entrevista à Folha de S.Paulo, o líder do governo no Senado, Delcídio do Amaral (PT-MS), admitiu que o Planalto adotará a mesma estratégia utilizada nas sessões anteriores. Se sentir que não tem votos suficientes para manter seus vetos, tentará esvaziar a sessão para derrubá-la por falta de quórum. Segundo ele, a eventual manutenção dos vetos representaria “uma avenidona” para o governo debater projetos econômicos.



De acordo com a Folha, o governo responsabiliza reservadamente os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), pela aprovação das propostas que aumentam os gastos públicos. Os dois, porém, lembram que parlamentares da base governista apoiaram as medidas e o Planalto não ofereceu grande resistência à aprovação desses projetos durante sua tramitação no Congresso.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Improviso é a marca do Governo Dilma

Por Vicente Nunes para o Tribuna na Internet.

Charge de DUKE

Dilma Rousseff confirma a fama de governar por improviso
O governo está convencido de que, com o pacote de aumento de impostos e corte de gastos que anunciou, vai evitar que uma segunda agência de classificação de risco – a Moddys’ ou a Fitch – siga o caminho da Standard & Poor’s (S&P) e rebaixe o país. Mas é melhor o Palácio do Planalto se preparar. Apesar da confiança que os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, tentaram passar durante o anúncio das medidas, que somam quase R$ 65 bilhões, o que se viu foi mais espuma do que uma vontade concreta de fazer um ajuste fiscal consistente para pôr as contas públicas em ordem.


Se realmente quisesse fazer o dever de casa, o governo não teria esperado passar 15 dias do envio do Orçamento de 2016 ao Congresso, que resultou na retirada do grau de investimento do Brasil pela S&P, para só então apresentar propostas com o intuito de cobrir o rombo de R$ 30,5 bilhões e garantir superavit primário de 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB) no ano que vem. Teria feito isso dentro do prazo regulamentar, até 31 de agosto.


Ao agir no afogadilho, pressionada pela perda do selo de bom pagador e pelo risco de o país enfrentar um ataque especulativo, a presidente Dilma Rousseff confirma a fama de conduzir o Brasil com improviso. Não por acaso, a economia está afundando, o desemprego, caminhando para 10% e a inflação, muito distante do limite de tolerância, de 6,5%.



A petista, infelizmente, primou pela incompetência. Agora, está jogando toda a conta dos desmandos dos últimos quatro anos no colo da população. Os trabalhadores que se virem para engordar os cofres do Tesouro Nacional, com R$ 32 bilhões da CPMF por ano.



Não é possível que alguém acredite que as empresas vão arcar com o custo do tributo que Dilma quer ressuscitar a qualquer custo. Tudo será repassado para os preços, que vão subir justamente em um momento em que os salários estão queda, as famílias endividadas e tendo que lidar com a perda de emprego.



Para Dilma, a visão é a seguinte: que mal importa pagar 0,2% sobre toda a movimentação financeira para dar uma mãozinha a um governo perdulário. Sempre foi assim. Não será diferente agora, que o país precisa dar uma satisfação às agências de risco e evitar o colapso da economia.

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Abusos e Mordomias

Editorial FOLHA SP em 13SET


Mordomias e abusos
Em tempos normais, a notícia de que o Senado renovou a frota de veículos à disposição de seus 81 legisladores já provocaria justificáveis questionamentos –tendo meros dois anos de estrada, os carros substituídos não poderiam ser considerados velhos.

A situação, naturalmente, torna-se muito pior quando o país enfrenta grave crise econômica. Neste caso, a desfaçatez dos senadores desperta sentimentos de irritação e perplexidade.

Arte de BRUM


Verdade que os automóveis hoje são alugados. O contrato custou R$ 2,2 milhões/ano; a opção pela locação, implementada em 2011, proporcionou economia anual de R$ 2,6 milhões pela extinção de gastos com compra, manutenção e seguro.

Ótimo que tenham poupado tais despesas. Mas, no momento em que se impõem aumento da carga tributária e cortes em programas sociais, como os políticos pretendem defender que os cofres públicos sustentem essas vantagens?

Arte de G ENILDO


Afinal, qual seria a justificativa do privilégio? Não consta que deputados federais tenham suas atividades comprometidas pela ausência de veículos oficiais.

Não se imagina que a extinção dessa mordomia possa aliviar a crise econômica. Mas, além do muito que haveria de simbólico na medida, deve-se lembrar que a lista de regalias é bem mais extensa.

Arte de SPONHOLZ



O mimo automotivo se completa com 300 litros mensais de combustível. Senadores também dispõem de celulares sem limite de gastos e compensação ilimitada de despesas médicas, extensiva a cônjuges e dependentes até 21 anos – espantosamente, ex-senadores têm direito a R$ 33 mil de reembolso de despesas médicas por ano.

Há mais: cinco passagens aéreas mensais de ida e volta para seus Estados e uma sala reservada no aeroporto de Brasília, onde oito servidores ajudam no embarque e no despacho das bagagens.

Arte de SINFRONIO


Em matéria de privilégios, a Câmara não fica atrás. No começo deste ano, por exemplo, a Casa reajustou a verba de gabinete dos deputados para R$ 92 mil por mês.

Abundam, ademais, despesas no mínimo questionáveis. Até julho foram pagos R$ 50,6 milhões em horas extras para servidores devido a sessões extraordinárias. Eram realmente necessárias? Duas delas serviram para o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), manobrar e reverter decisões tomadas pouco antes pelo plenário.

Arte de SID


Tudo somado, o Congresso custará R$ 9,2 bilhões neste ano. Como se vê, há muito a economizar pela simples eliminação de absurdas mordomias e racionalização de certos dispêndios.

O raciocínio sem dúvida se aplica igualmente aos três Poderes da República, em todos os níveis da Federação. Passa da hora de as autoridade brasileiras demonstrarem algum senso de responsabilidade com o dinheiro do contribuinte.

sexta-feira, 24 de julho de 2015

O direito de defesa e a crise brasileira

Por Ives Gandra Martins, para o ESTADÃO 

O direito de defesa e a crise brasileira 
Durante os últimos anos, numa série de artigos para O Estado de S. Paulo, vinha alertando que o País chegaria à dramática situação atual por manifesta incapacidade da presidente em analisar a conjuntura brasileira e mundial e apresentar soluções macroeconômicas capazes de permitir ao Brasil desenvolver-se. Como a economia não é uma ciência ideológica, mas psicossocial, o fracasso que previra, nos últimos anos, teria de chegar, como chegou.

Arte de JORGE BRAGA


Congelamentos, que desde Hamurabi nunca foram bem-sucedidos; inchaço da máquina estatal, com um exército de não concursados – em torno de 115 mil – que propiciaram toda espécie de concussão e corrupção conhecida; apoio às ditaduras (cubana e a quase ditadura venezuelana); auxílio a países de economia fragilizada, em vez de investir na competitividade nacional; preconceitos contra países desenvolvidos; aumento exagerado da carga tributária; utilização de bancos e companhias estatais para fechar furos orçamentários, e não para o desenvolvimento nacional; promessas eleitorais opostas à própria ação governamental; e muitos outros erros palmares levaram a economia ao estado em que está.

Arte de THIAGO LUCAS

O próprio ajuste fiscal, no momento, é uma falácia, pois incide sobre estudantes, trabalhadores e empresários (Fies, redução de direitos e aumento da carga tributária), e não sobre a esclerosadíssima máquina estatal, que mantém seus 39 ministérios e sua legião de amigos do rei. O Bolsa Família, que consome apenas 2% do Orçamento, é também uma ilusão, pois, além de representar aposentadorias precoces – quem a recebe tudo faz para não perdê-la –, é dez vezes menor do que os vencimentos de servidores públicos da União, ativos e inativos, que somam pouco mais de 1,5 milhão de cidadãos. Como dizia Roberto Campos, “com esse tipo de mentalidade, o País não corre o risco de melhorar”.

Arte de GIANCARLO


Por outro lado, a independência da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público (MP) tem desventrado, para desconforto do governo federal e para espanto da Nação, a podridão dos porões oficiais, numa tentativa de moralização dos costumes políticos, dolorosamente maculados, nos últimos 12 anos.

Para mim, há muito mais concussão dos agentes governamentais, impondo condições de concorrência criminosa, do que corrupção, em que é o particular que corrompe a autoridade, e não o contrário.

Arte de SPONHOLZ


Graças à Polícia Federal, principalmente, ao Ministério Público e a este especialista no tema lavagem de dinheiro – ao lado de Bruno Rezende, cujo livro sobre a matéria prefaciei – que é Sérgio Moro, os quais não prestam vênia ao poder, mas à Justiça, está o Brasil descobrindo como foi a Nação saqueada em bilhões e bilhões de reais, por autoridades oficiais. Merece elogios, neste quadro, a figura do ministro da Justiça, que, como bom professor de Direito Administrativo, não tem procurado interferir na ação da Polícia Federal, apesar de estar esta subordinada à sua pasta.

Arte de SPONHOLZ


Nada obstante o indiscutível mérito que a PF, o MP e o Poder Judiciário estão demonstrando, há reparos a fazer. Uma democracia se caracteriza pelo direito de defesa, que não há nas ditaduras, bastando olhar para os sistemas judiciários de Cuba e da Venezuela.

Ora, o direito de defesa pressupõe a proteção do acusado, em primeiro lugar. O processo penal, como afirmou o saudoso mestre Canuto Mendes de Almeida, não é feito para proteger a sociedade, mas o acusado. Sem ele, ao fazer justiça com as próprias mãos, a sociedade vai para linchamentos públicos ou para tribunais populares, como no período de 1791 a 1794, na França; de 1936 a 1938, na Espanha; ou os famosos paredóns de Fidel Castro, em que os acusados eram guilhotinados ou fuzilados, sem direito de defesa. Apesar de, permanentemente, prestigiado pelo governo brasileiro, em que muitos de seus participantes no passado pretenderam implantar uma ditadura cubana no País, em Cuba e na Venezuela o direito de defesa foi reduzido a sua expressão quase nenhuma. Por isso fala o constituinte brasileiro, no artigo 5.º, inciso LV, em ampla defesa assegurada ao acusado.

Arte de NEWTON SILVA


Ora, nas prisões preventivas determinadas na famosa Operação Lava Jato, tal direito tem sido tisnado, pois a medida, que deveria ser excepcional, passou a ser de uma rotina preocupante, em que a mera imprecisa acusação ou um texto fora do contexto podem levar o suspeito a meses de detenção, da qual só sairá se fizer uma delação premiada, como alertou Antonio Cláudio Mariz de Oliveira em artigo neste jornal.

Há empresários que, sem figurarem em qualquer delação premiada e sem prova de sua participação em qualquer ato ilícito concreto, tiveram sua liberdade segregada, passando, pois, a exceção a ser regra perigosa, a dar insegurança jurídica a todo e qualquer cidadão.

Arte de SAMUCA


Não é possível utilizar a medida excepcionalíssima fora dos requisitos que a autorizam, para forçar a delação premiada, mesmo que o acusado não deseje fazê-la ou não tenha o que delatar. Tal procedimento, além de macular o direito de defesa e subverter o princípio da presunção da inocência, passa a ser uma espécie de tortura sofisticada do século 21.

Conhecendo e defendendo a excelência da Polícia Federal – à qual, a meu ver, compete exclusivamente a presidência do inquérito policial (art. 144 § 4.º da Constituição federal) – e conhecendo a idoneidade e o conhecimento profundo sobre crimes de lavagem de dinheiro do juiz Sérgio Moro, não posso deixar, entretanto, de manifestar minha imensa preocupação com medidas que fragilizam o direito a defesa, fundamental na democracia, mediante a banalização das prisões preventivas por prazos indefinidos, algo que, como um octogenário professor de Direito Constitucional, sinto-me na obrigação de trazer à reflexão dos operadores do Direito, das autoridades judiciais do País e de toda a sociedade.

terça-feira, 26 de maio de 2015

Quem manda, é Levy ou Dilma?

Por Josias de Souza, em seu blog

Dilma tem um ministro ou é o Levy que a tem?
Depois da tempestade que Dilma Rousseff provocou na economia veio a cobrança. O desmantelo do primeiro mandato foi grande. E a presidente virou outra depois que o eleitorado lhe deu uma segunda chance. Uma mulher, assim, do mesmo tamanho, só que bem mais magra e muito mais fraca.

Dilma continua filiada ao PT, mas decidiu ser mais realista que o PSDB. A metamorfose cobra-lhe um preço político tão alto que a presidente ainda não entendeu bem se é ela que tem um ministro da Fazenda ou se é Joaquim Levy que a tem. Da resolução desse dilema depende o futuro do governo de madame.

Arte de MARIO


Ao privar a plateia de sua presença no palco montado para o anúncio do megacorte orçamentário de R$ 69,9 bilhões (pode me chamar de sorvo de gigante), Levy sinalizou que não está interessado no ziguezague de um jogo de gato e rato. Ultraliberal, o ministro é adepto do comunismo de resultados de Deng Xiaoping: não importa se o gato é preto ou branco, desde que cace os ratos.

Levy foi convocado para cumprir duas tarefas: fechar o cofre e arrancar do bolso do contribuinte a grana que vai tapar a cova que Dilma cavou para si mesma. Antes de aceitar o desafio, avisou que o esforço seria grande e penoso. Recebeu carta branca. Perguntou sobre o Congresso. Disseram-lhe que não haveria problemas.

Arte de IOTTI

Decorridos menos de seis meses, Levy toma café da manhã, almoça e janta com congressistas arregimentados por Michel Temer. E vê seu ajuste fiscal ser mastigado por um Legislativo rendido às conveniências dos investigados Eduardo Cunha e Renan Calheiros, morubixabas do PMDB do vice-presidente.

Sem respostas conclusivas do Congresso, Levy quis empurrar o talho no Orçamento para a vizinhança da casa dos R$ 80 bilhões. Dilma piscou. E o ministro se deu conta de que é chefiado por um ponto de interrogação com crise existencial. A presidente tornou-se uma dúvida que sofre com o desencontro entre sua teoria e sua prática.

Arte de MYRRIA


Na teoria, Dilma já havia percebido que seus primeiros quatro anos foram como uma festa que acabou em detritos e exames de consciência. Ela também já notara que, para que outra festa comece, alguém terá de colocar o abajur em pé, limpar o vômito no banheiro e tirar as manchas de vinho do tapete.

Levy topou fazer a faxina. Mas parece incomodado com a fofoca segundo a qual os colegas Aloizio Mercadante (Casa Civil) e Nelson Barbosa (Planejamento) fazem sua caveira junto à presidente, na cozinha do Planalto. Leva o pé atrás porque sabe como esse tipo de tititi termina. Pode acabar em triunfo ou em desastre.

Arte de REGI


Levy chefiava o Tesouro Nacional no alvorecer do primeiro reinado de Lula. Viu Antonio Palocci tocar a Fazenda blindado por Lula das emboscadas palacianas. Saneadas as contas, Lula atravessou o mensalão, reelegeu-se e enfiou o pé na jaca para fazer a sucessora.

Levy era diretor do Bradesco quando Dilma, eleita pela primeira vez, decidiu acumular as funções de presidente e de titular da Fazenda, convertendo o companheiro Guido Mantega em ministro-fantoche. Deu em ruínas e na vitória magra de 2014, contra o voto de Levy, um eleitor de Aécio Neves.


Arte de AROEIRA


Incomodado, Levy parece tentar esclarecer que não tem vocação para Mantega. Dilma governa com a ilusão de que tem um ministro da Fazenda. Se Levy der no pé, a onda de desconfiança será tão avassaladora, que a presidente logo descobrirá que teria sido melhor e mais barato que o ministro a tivesse.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Corte sem corte

Por Mary Zaidan,  no Blog do Noblat


Corte sem corte
Quase R$ 70 bilhões. Ainda que inferior ao desejo do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, o contingenciamento anunciado sexta-feira no Orçamento da União – o maior da história – impressiona. As lâminas chegaram à Educação e à Saúde, em obras do PAC, e até na menina dos olhos da presidente Dilma Rousseff, o programa Minha Casa, Minha Vida. Mas, de novo, não se viu corte algum no custeio, no tamanho da máquina que não para de inchar.

Arte de CLAYTON


Os cortes são mais do que necessários, mas correm longe de ser solução para o país, dilapidado por mais de uma década pelos governos petistas que se divertiram gastando mais do que deviam e podiam.

Antes de tudo, são bombas de efeito antecipado em um ambiente político em que só o cheiro de pólvora já faz tudo explodir.

Ninguém no governo – nem mesmo Levy – pensou em dividir a conta com o próprio governo e com setores ainda intocados: juízes, parlamentares, servidores públicos. Não se abriu mão de um simples ministério, de um único cargo de confiança. Não se mexeu em privilégios. Não se fez um mero gesto.

Arte de CLAUDIO


Na Previdência, por exemplo, um milhão de aposentados do serviço público respondem por mais R$ 60 bilhões do déficit, os outros R$ 50 bilhões de rombo são relativos aos 30 milhões de segurados do INSS. Um vespeiro do qual ninguém quer passar por perto.

Sequer uma voz sobre renegociação de contratos, mesmo depois de as investigações na Petrobras revelarem percentagens fixas de corrupção, padrão que, se acredita, repetia-se em obras de todo o país.

Nem o decreto de Dilma para redução do uso de aviões da FAB por ministros foi cumprido, como, há mais de mês, revelou a jornalista Maria Lima, em O Globo.

Arte de PELICANO


Difícil crer que algo tenha mudado.

Elogiados como ato “de coragem” pela diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, para arrepio de alguns setores do PT, os cortes são um ambicioso conjunto de intenções. Diferentemente das medidas provisórias que estão no Parlamento, não produzem efeito imediato. Mesmo sendo valores estratosféricos, apenas limitam os já baixíssimos investimentos do governo e, de quebra, têm caráter recessivo.

Sabe-se que Dilma, Lula e a maior parte do PT odeiam ter de dar o braço a torcer a políticas que até ontem eles taxavam como neoliberais. A trinca, em especial Lula, sabe ainda que qualquer possibilidade de êxito em 2018 depende do sucesso desse rearranjo na economia, seja ele ortodoxo, de direita, conservador.

Arte de SPONHOLZ


No momento, se aceita tudo, até aumento de impostos. Só reagem ao desabrigo dos companheiros aboletados no governo. Isso não. Mexer nos cargos de livre nomeação, nem pensar.

Ao que parece, não percebem a exaustão da fábula: as formigas já trabalham cinco meses por ano para encher as burras do governo. Não suportam nem mesmo o canto da cigarra.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

Justiça brasileira, descaso com os cidadãos

Por Bernardo Mello Franco, em sua coluna na FOLHA


Justiça cega
Na Roma antiga, a Justiça era retratada como uma deusa de olhos cobertos, que não enxergava para ser imparcial ao decidir. No Brasil de hoje, a Justiça também se diz cega, mas parece usar a venda para não ver a crise no país.

Enquanto os trabalhadores comuns sofrem com demissões e cortes de direitos, o Judiciário quer aumentar o salário de seus servidores em 31,4% neste ano. O plano prevê reajustes até 2017. Em quatro anos, custará R$ 25,7 bilhões ao Tesouro, calcula o Ministério do Planejamento.

Arte de PASSOFUNDO


A bomba ameaça implodir o ajuste fiscal, mas ganhou o apoio militante do presidente do STF, Ricardo Lewandowski. "Nós precisamos sempre [de reajuste]. Quem é que não precisa pagar o supermercado, já que houve um aumento do preço dos produtos?", disse, nesta segunda.

Para azar do contribuinte, o ministro não está sozinho na cruzada corporativista. Em setembro passado, seu colega Luiz Fux determinou o pagamento de auxílio-moradia de R$ 4.300 a todos os juízes do país.

Arte de BOOPO


A benesse foi aplaudida pelo presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, José Renato Nalini. "Não dá para ir toda hora a Miami comprar terno", afirmou. "O auxílio foi um disfarce para aumentar um pouquinho. E até para fazer com que o juiz fique um pouquinho mais animado, não tenha tanta depressão, tanta síndrome de pânico, tanto AVC."

Nesta terça, a Assembleia Legislativa do Rio começou a discutir mais um benefício para os magistrados fluminenses: um "auxílio-educação" de até R$ 2.860 ao mês. Com o sinal verde de Lewandowski, está aberta uma nova corrida por privilégios.



*Além das mordomias para os juízes, a única coisa que cresce no país é a coleção de gafes presidenciais. Nesta segunda, Dilma Rousseff chamou o ministro Edinho Araújo (Portos) de Edinho dos Santos. O prefeito de Niterói (RJ), Rodrigo Neves, foi rebatizado de Rodrigues.

quarta-feira, 20 de maio de 2015

A casa da Mãe Dilma

Direto de Carlos Brickmann


A casa da Mãe Dilma

  • Nunca dantes na História deste país aconteceu fato semelhante: o Governo Federal ainda não pagou os livros comprados para escolas públicas em 2014 pelo PNLD, Programa Nacional do Livro Didático. Todos os Governos dos últimos 30 anos pagaram os livros em dia, sempre em janeiro. E não é tudo: já se sabe que, nas licitações de setembro e outubro, a Pátria Educadora cortará fundo as verbas destinadas a livros didáticos. Como disse um líder educador, ler dá azia.
Arte de SID


  • Apesar da Lei de Transparência, a Presidência da República segura as informações sobre o cartão corporativo de Rose Noronha, que chefiou seu escritório em São Paulo. Pediu 45 dias para copiar e entregar o relatório dos gastos da servidora.
Arte de SPONHOLZ


  • Inauguração de três edifícios do Minha Casa, Minha Vida no Rio. Dilma caprichou: começou chamando o ministro interino dos Esportes, Ricardo Leyser, de "Gleyser". E chamou-o de ministro dos Transportes. Claro: com 38 ministérios, não vai lembrar todos os cargos que distribuiu nem o nome das Excelências. Em seguida, garantiu que muitos dos beneficiados pelos apartamentos pagavam "de R$ 300 mil a R$ 400 mil" de aluguel. Um dos condomínios foi chamado primeiro de Recanto das Gaivotas e, depois, de Jardim das Gaivotas. Na terceira virou Vivenda das Gaivotas, o nome certo. Mas Dilma foi aplaudida assim mesmo. E o Gleyser que já foi Leyser e era ministro de outra pasta puxou as palmas.
Arte de AMARILDO

  • Comemore! Dentro de poucos dias, em 31 de maio, o caro leitor concluirá seu período de trabalho anual dedicado exclusivamente ao pagamento de impostos. Foram 151 dias destinados ao sustento da máquina estatal. A partir de 1º de junho, o caro leitor poderá trabalhar para seu próprio sustento e o de sua família. Viva!

quinta-feira, 26 de março de 2015

Malhando Dilma de Aleluia

Por Vinícius Torres Freire.
FOLHA SP em 25MAR2015

A malhação de Dilma
"QUE FASE." Quando o governo acerta uma no cravo, martela duas na ferradura e leva três na canela. Na segunda-feira, teve a satisfação triste e diminuta de saber que não levou ponto negativo em sua nota de crédito, dada por uma dessas agências de avaliação de risco de calote. Alegrias pobres duram pouco.

Ontem, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), disse a líderes empresariais da indústria que Dilma Rousseff vai comer o pão que ela própria amassou antes de ver o pacote de corte de gastos do governo aprovado no Congresso. Foi aplaudido.

Arte de NEWTON SILVA


Calheiros e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB) têm dito em público e a algumas lideranças empresariais maiores que não vão colocar fogo no circo, não vão derrubar o corte de gastos, o "ajuste fiscal". Mas a cada dois ou três dias demonstram também que vão triturar politicamente o governo. Ameaçaram, mas enfim recuaram, deixar correr projeto de lei que reajusta todos os benefícios do INSS pelo valor do salário mínimo. Querem fazer valer logo, regulamentar, a lei que reduz a dívida de Estados e municípios com a União, mais um talho nas receitas federais.

Ontem, Calheiros cantou alto a ária preferida de empresários e aliás de quase todo o mundo. Isto é, o governo tem de cortar "seus gastos", não aumentar impostos, como pretende fazer no caso da contribuição patronal para o INSS, medida que deixou o empresariado em geral fulo. Mas o governo vai cortar onde?

Arte de HEITOR


Reduzir o número de ministérios rende apenas um troco. Melhorar as contas do governo ora implica reduzir benefícios sociais, investimento "em obras" ou fechar partes do governo (isso: fechar).

No entanto, centrais sindicais e movimentos sociais malham e querem queimar o PT como Judas, para nem falar dos parlamentares que ameaçam debandar, todos por causa de cortes sociais. Para piorar, o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, foi ontem a público negar que o governo vá maneirar no talho social a fim de agradar a Lula, ao PT, a agregados e a simpatizantes.

Arte de SPONHOLZ


Logo, vai sobrar ainda mais para os investimentos. A recessão deve, assim, piorar. Obras vão parar ou ficar sem pagamento, como já acontece, o que vai causar mais raiva entre empresas e trabalhadores. Em um ano, a construção civil já demitiu uns 8% de sua força de trabalho, quase 280 mil pessoas na rua.

Suponha-se que Calheiros e Cunha não queiram tocar fogo no circo econômico (sabem que reduzir o ministério não rende nada em termos fiscais). Pode ser então que estejam emparedando o governo, ganhando mais território, talvez até reduzir Dilma Rousseff a presidente do Vaticano ou de San Marino. Tendo ficado com mais poder ou, quem sabe, tendo empurrado a presidente no precipício, farão o que da massa falida, talvez caótica?

Arte de LUSCAR


Até cortar gasto a machadadas está difícil, pois há muita despesa protegida por lei, crescente, e a receita do governo não cresce. O decerto lunático Orçamento federal prevê um AUMENTO real de uns 9% na receita, mas no primeiro bimestre do ano a receita CAIU 3% em termos reais.

Enfim, esta é a malhação de Dilma com pauladas econômicas. Há CPIs, polícia, procuradores, Justiça. Ninguém ainda se arrisca a dar sentido a esta crise.