Crônicas
Hoje a festa é sua, hoje a festa é nossa
Sempre fico tenso com aquela vinheta de fim de ano da Globo, “Hoje a festa é sua, hoje a festa é nossa”.
Sei que aquilo é feito para me animar, para lançar meu espírito rumo ao firmamento e fazer-me sonhar docemente com as alvíssaras do novo dia de um novo tempo.
Mas não consigo.
Olho para as cenas de todos aqueles artistas tão felizes e penso justamente no que não vejo. O Bonner está lá, bem faceiro, que ele é um tipo faceiro. O Jô Soares também, embora seu sorriso ande meio torto. A Carolina Dieckmann, dourada e lânguida, é o próprio verão carioca.
Mas e os que não apareceram?
Imagino aquele ator de, digamos, Malhação. Ele vibrou, quando foi convocado por e-mail para a gravação. Contou para a mãe, para a namorada, para os amigos:
_ Vou aparecer na vinheta de fim de ano da Globo!
Todos aplaudiram, excitados. Urru! E ele passou os dias decorando a letra e a coreografia. Batia com as mãos no peito, estalava os dedos e cantava, contente, acreditando na letra da canção:
_ Todos nossos sonhos serão verdade! O futuro já começou!
No dia aprazado, lá se foi ele, vestido de branco da cabeça aos pés. Antes de sair, a mãe mandou que tirasse a camisa e passou-a a ferro com critério. Não ia deixar o filho aparecer para o Brasil inteiro vestindo aquela camisa que parecia que ele tinha guardado dentro da garrafa.
Foi um longo dia de gravações, da manhã à noite, horas e horas intercaladas por sanduíches vulgares e sucos mornos. Quando ele voltou para casa, a família o cercou, dardejando-o com perguntas:
_ Como foi? Como foi?
_ Muito legal. Conheci o Faustão!
Na noite em que a vinheta seria lançada, ele se reuniram em frente à TV. Estavam todos, entre sorridentes e ansiosos: a família orgulhosa, os amigos dando-lhe tapinhas nas costas, a namorada fazendo olhares de promessas, veio até aquele primo-irmão que morava em Bento Gonçalves.
No intervalo do Jornal Nacional, a musiquinha explodiu:
“Hoje é o novo dia...”
Mas cadê o nosso herói?
_ Cadê você? _ Perguntavam. _ Cadê? Cadê?
Maldição! Bem que disseram que ele tinha de ir naquele bolo para abraçar a Regina Duarte. Aqueles é que eram espertos. Cadê? Cadê? De repente, ele apontou para a tela:
_ Ali! Ali!
_ Onde?
_ Ali!
_ Com o Galvão Bueno?
_ Não! Do lado do Francisco Cuoco!
_ Aquele é você?
Era. Mas o Jornal Nacional já recomeçou...
Então, o ator de Malhação deve ter rilhado os dentes e, pensando em todas as vezes em que deram close no Tony Ramos balançando os braços cebeludos, jurou:
_ Ainda vou dar o troco, Tony! Ainda vou!
Lembre-se disso, quando você vir a vinheta da Globo. E entenda como se sente o Michel Temer.