Clima de eleição
Fernando Henrique mordeu a isca. Tudo que os petistas queriam era que um tucano de bico grande entrasse na briga da pré-campanha. Serra, matreiro, tomou distância. Aécio, idem, não quis entrar na briga, dizendo que não era o caso de fazer comparação entre ciclos. Todos deram sua contribuição ao progresso do país. E aí Fernando Henrique assume, por inteiro, a querela : vale a pena, diz ele, entrar na briga. Sem medo do passado. Seu artigo no Estadão do último domingo, ao lado do meu, fez furor. Na sequência, diz que falta liderança à Dilma.
Ora, essa brigalhada é ruim para José Serra. E a razão é simples : na comparação entre as eras FHC e Lula, os dados favorecem os petistas. Não adianta querer argumentar que o Plano Real, de Itamar/FHC, foi a base que colocou a economia nos eixos.
Xalberto
A verdade é que os braços assistencialistas do governo Lula são mais extensos. O Brasil se beneficiou das crises que afetaram o mundo na última década. Os eixos macroeconômicos foram fixados pelo governo tucano e aprofundados no atual governo. Mas o crescimento do país não se deu no ritmo desejado. O Brasil pouco cresceu.
É bem verdade que Lula é um bom propagandista. FHC é mais um schollar, um acadêmico respeitado. E Lula, ao fazer a comunicação direta com as massas, trombeteia todos os dias os feitos do governo. Repete, repete, usa linguagem simbólica, chavões, refrãos e até palavras chulas. Quanto mais ele é criticado, mais apimenta a linguagem. Ganha em matéria de comunicação. E a situação estável do país será intensamente usada como cobertor eleitoral.
Pois bem, o colchão econômico em que se deita o país tem sido responsável pela boa performance da ministra Dilma Rousseff. Dilma anda no tapete estendido por Lula. Sua boa intenção de voto - cerca de 30% hoje - deriva não de suas qualidades de gerente ou mãe do PAC mas dos votos transferidos por Luiz Inácio. Não há dúvida que a transferência já começou a ocorrer. Principalmente nas regiões favorecidas pelo Bolsa Família.
Não concordo com Carlos Montenegro, do Ibope, que garante enfaticamente a derrota da candidata governista. Acho que as coisas estão indefinidas. Se política fosse lógica econômica, Dilma seria a vencedora, considerando-se a teia de programas que o governo Lula estabeleceu para todas as classes sociais. Da base da pirâmide ao topo, contabilizam-se uns 20 programas voltados para benesses e redistribuição de renda.
Alecrim
Se eleição privilegiasse a questão do perfil, Serra seria o grande vencedor. Exibe perfil muito mais denso que Dilma. Preparado, experiente, conhecedor do país, já foi agraciados com milhões de votos. Dilma nunca recebeu um voto sequer.
Mas eleição, hoje, leva em conta outros fatores que não aqueles de antigamente. Fatores da organodemocracia, que é a democracia das organizações intermediárias da sociedade - associações, movimentos, clubes, federações etc. A política afunda-se no vazio.
Ora, foi o próprio ministro da Justiça, Tarso Genro, que usou o termo vazio. Disse que Dilma foi escolhida por conta do "vazio" do PT após o mensalão. Não havia outro candidato. Lula pinçou Dilma do bolso do colete. Um perfil técnico condizente com a democracia de cunho orgânica deste século XXI.
No século XIX, tínhamos uma democracia atomizada. Cada eleitor, um átomo social, a ser conquistado por candidatos distintos com propostas para agradar aos desiguais. Hoje, o átomo cede lugar aos grupos e coletividades, que se tornam homogêneas. Já os candidatos são clones, muito parecidos.
Seri
Sob essa moldura, as eleições vão ocorrer com partidos pasteurizados, siglas amorfas, eleitores desmotivados, oposições com discurso oco e indefinido, parlamento estiolado, doutrinas em franco declínio.
O que sobra é um pano de fundo - economia estável, programas assistencialistas, massas relativamente satisfeitas com o governo. E uma classe C que aglutina 46% de toda a renda nacional, mais que a soma das rendas das classes A e B. Essa classe, que pulou para a área média da pirâmide no ciclo Lula, vai eleger o próximo presidente.
A não ser que ...
Lute / a charge
A não ser que os serviços do Estado nas áreas de saúde, segurança e educação sejam tão ruins que acabem amortecendo os feitos do governo Lula. E, como se sabe, segurança continua a ser um caos; a saúde é um desastre e a educação, apesar do esforço desse inteligente ministro Fernando Haddad, continua muita defasada.
Há um fenômeno a ocorrer nos próximos meses que terá algum impacto no clima social : a copa do Mundo. Se o Brasil for campeão, o estado de ânimo se elevará. A alegria será contagiante. Os poros sociais se encherão de oxigênio. Candidatos governistas são mais beneficiados por este clima catártico. A recíproca é verdadeira.
Duke