quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Por Carlos Brickmann. Transcrito de Brickmann & Associados

O país dos réus confessos
Dizem que, num concurso mundial de Polícias, o último teste era localizar um coelho no mato. Os brasileiros foram os campeões: em pouco mais de dois minutos, trouxeram um porco todo machucado, gritando: “Sou coelho! Sou coelho!”
O caso dos três rapazes que ficaram dois anos presos por um homicídio - agora confessado por um assassino maníaco - não é exceção: desde O Caso dos Irmãos Naves, que deu até filme, vemos histórias como essa.
Os suspeitos, sem assistência jurídica, ficam nas mãos de “hábeis interrogadores”, e confessam o que lhes for mandado. Defensoria Pública? Num Estado como São Paulo, o número de defensores públicos não chega a 20% do de promotores.
E como agem os promotores? O que cuidou do processo dos rapazes disse que “confiou na Polícia”. Mas autoridade é como jornalista: seu trabalho não é confiar, é desconfiar.
Nenhuma autoridade desconfiou também do caso da mãe cuja filha morreu, e que foi acusada de envenená-la com cocaína na mamadeira. Não havia cocaína na mamadeira, mas a Polícia achou que havia e o promotor confiou na Polícia. Bom, a moça era inocente. Mas, na cadeia, as outras presas a agrediram, por matar uma criança. Ficou sem audição num dos ouvidos. Por pouco não morreu.
Os rapazes e a moça podem pedir indenização ao Estado pela injustiça que sofreram. Vão pedir, vão ganhar; e algum dia, quem sabe, vão receber, já que a indenização vai virar precatório, e os precatórios estão com atraso de muitos anos.
E ainda há gente que acha que, se a Polícia prendeu, ninguém pode soltar!
Não pense, porém, que o abuso policial só atinge os pobres. Há algum tempo, um cavalheiro muito bem sucedido foi preso no lugar de outro, e ficou 11 dias na cadeia. Os dois não tinham qualquer semelhança e o sobrenome era outro, mas o primeiro nome era Hugo. Prenderam o primeiro Hugo que encontraram e foi difícil soltá-lo (aliás, o Hugo que queriam prender nunca foi preso).
E, na Operação Satiagraha, policiais com metralhadoras invadiram o consultório de um dentista famoso, exigindo, com as armas apontadas, que ele confessasse que era mais alto, mais cabeludo, mais corpulento, mais velho, e que usava aquelas cadeiras de dentista equipadas com motorzinho para exercer a profissão de doleiro.