terça-feira, 5 de abril de 2016

Nem Dilma nem Temer

Editorial de a FOLHA SP


Nem Dilma nem Temer
A presidente Dilma Rousseff (PT) perdeu as condições de governar o país.

É com pesar que este jornal chega a essa conclusão. Nunca é desejável interromper, ainda que por meios legais, um mandato presidencial obtido em eleição democrática.
Arte de MIGUEL


Depois de seu partido protagonizar os maiores escândalos de corrupção de que se tem notícia; depois de se reeleger à custa de clamoroso estelionato eleitoral; depois de seu governo provocar a pior recessão da história, Dilma colhe o que merece.

Formou-se imensa maioria favorável a seu impeachment. As maiores manifestações políticas de que se tem registro no Brasil tomaram as ruas a exigir a remoção da presidente. Sempre oportunistas, as forças dominantes no Congresso ocupam o vazio deixado pelo colapso do governo.

A administração foi posta a serviço de dois propósitos: barrar o impedimento, mediante desbragada compra de apoio parlamentar, e proteger o ex-presidente Lula e companheiros às voltas com problemas na Justiça.





Mesmo que vença a batalha na Câmara, o que parece cada vez mais improvável, não se vislumbra como ela possa voltar a governar. Os fatores que levaram à falência de sua autoridade persistirão.

Enquanto Dilma Rousseff permanecer no cargo, a nação seguirá crispada, paralisada. É forçoso reconhecer que a presidente constitui hoje o obstáculo à recuperação do país.

Esta Folha continuará empenhando-se em publicar um resumo equilibrado dos fatos e um espectro plural de opiniões, mas passa a se incluir entre os que preferem a renúncia à deposição constitucional.

Arte de NANI


Embora existam motivos para o impedimento, até porque a legislação estabelece farta gama de opções, nenhum deles é irrefutável. Não que faltem indícios de má conduta; falta, até agora, comprovação cabal. Pedaladas fiscais são razão questionável numa cultura orçamentária ainda permissiva.

Mesmo desmoralizado, o PT tem respaldo de uma minoria expressiva; o impeachment tenderá a deixar um rastro de ressentimento. Já a renúncia traduziria, num gesto de desapego e realismo, a consciência da mandatária de que condições alheias à sua vontade a impedem de se desincumbir da missão.

A mesma consciência deveria ter Michel Temer (PMDB), que tampouco dispõe de suficiente apoio na sociedade. Dada a gravidade excepcional desta crise, seria uma bênção que o poder retornasse logo ao povo a fim de que ele investisse alguém da legitimidade requerida para promover reformas estruturais e tirar o país da estagnação.

Arte de SIMANCA


O Tribunal Superior Eleitoral julgará as contas da chapa eleita em 2014 e poderá cassá-la. Seja por essa saída, seja pela renúncia dupla, a população seria convocada a participar de nova eleição presidencial, num prazo de 90 dias.

Imprescindível, antes, que a Câmara dos Deputados ou o Supremo Tribunal Federal afaste de vez a nefasta figura de Eduardo Cunha –o próximo na linha de sucessão–, réu naquela corte e que jamais poderia dirigir o Brasil nesse intervalo.

Dilma Rousseff deve renunciar já, para poupar o país do trauma do impeachment e superar tanto o impasse que o mantém atolado como a calamidade sem precedentes do atual governo.