Por Hildeberto Barbosa Filho
Transcrito do Blogstraquis
Crônicas
Essas razões sociais
O mundo é mágico. A literatura é apenas real. Não, não vou defender uma daquelas teses estupendas e gloriosas. Quero apenas soletrar, no à vontade dessa letra lúdica, algumas nomenclaturas que refletem, em seu paradigma modelar e abstruso, o assombro e a fantasia de que as coisas são feitas. Sobretudo, quando nomeadas.
Borracharia J. Pinto Penteado, Pneus a Toda Prova.
O “J” deve de ser de Jair, de João, de Jaime, de Jeremias, de Janúncio, de Jesus ou de um José qualquer, pois “Virge, como tem Zé lá na Paraíba”, conforme lembra a voz
ritmada de Jakson do Pandeiro.
Vizinho, e dentro do mesmo ramo profissional, deparo-me com a Oficina de Mané Pineco, o Mágico da Mecânica, o Rei do Carburador e Milagreiro da Eletricidade. Tudo, em letras garrafais e coloridas, para chamar a atenção dos possíveis
clientes, numa espécie de marketing bronco e bizarro.
Observemos outros exemplares desses registros extravagantes.
- Mercadinho Branca de Neve e os Sete Anões: estoque variado e tudo de miudeza a gosto do freguês;
- Casa Mortuária Salve-se Quem Puder: preços confortáveis e diversas formas de pagamento, inclusive em prestações pós-mortem;
- Farmácia de Anaximandro Aristarco de Alencar: em cada remédio, uma dor aniquilada;
- Padaria Alvorada: além do pão francês, o doce, o crioulo, o papinha, o fresquinho, o dormido e o acordado;
- Armazém de Secos e Molhados: charque, feijão, farinha e fiado, e muito, muito mais.
- Ótica Tudo Vê;
- Papelaria Traça Não Entra;
- Magazine Florbela Espanca;
- Salão de Beleza Roberta Close;
- Casa de Ferragem Irmãos Ferrugem & Companhia;
- Empório das Elegantes Desesperadas;
- Bodega do Cacique Invertebrado;
- Casa Espírita Mensageiro do Além;
- Igreja Universal Caim e Abel;
- Terreiro de Madame Satã;
- Posto às Margem do Ipiranga;
- Academia de Letras dos Inéditos e Inexistentes;
- Banda Municipal Soluços do Silêncio;
- Derrotados Futebol Clube;
- Centro Cultural Terra Inculta;
- Praça Chega de Saudade;
- Cabaré de Mãe Santinha e
- Bar do Tetéu: o que não fecha nunca, e cuja marca primordial é servir uma sopa espessa, depois de meia noite, feita com o mesmo osso, requentado desde sua fundação, logo após a guerra de 1945.
Oxente, esse é em Minas,
mas achei o nome fabuloso, uai!
Pasme o leitor, se algum leitor me lê essas domingueiras estripulias verbais: nenhuma dessas razões sociais me é fruto da imaginação desmedida, mas realidades vistas e por mim constatadas in loco, no calor do tato, do odor e do paladar, experimentados na geografia de muitas cidadezinhas perdidas nesse mundão de Deus.
Quem quiser checar, faça uma visitinha a Cajazeiras, Pombal, Itaporanga, Santa Luzia, Taperoá, Cabaceiras, Boqueirão, Aroeiras, Itatuba, Soledade, Puxinanã, Galante, Cuité, Bananeiras, Esperança, Lagoa Seca e Campina Grande, em cuja origem estala do reino malvado...