quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Ato falho - por André Carvalho


Por André Carvalho (*)
 em 20 de agosto de 2013
ATO FALHO
Pelo rumo da prosa o boato sobre a extinção do Programa Bolsa Família, que provocou tumultos e depredações nas agências da Caixa Econômica Federal, entrará para o rol das macaquices dos aloprados da vez. A Polícia Federal concluiu que o boato foi “espontâneo” não havendo como afirmar quais pessoas ou grupos foram responsáveis por sua criação e propagação. Em nota, o órgão esclareceu não haver, no caso, ocorrências que configurem crime ou contravenção penal. Indiscutível, em se tratando de Polícia Federal. 

Entretanto, o resultado da investigação policial atirou ao rebotalho da escala ética algumas figuras de grosso calibre e péssima mira do governo federal e do Partido dos Trabalhadores que aproveitaram a comoção social que aflorou pós-boato para borrifar veneno na oposição e nos cidadãos de bem deste pobre país.

Não é difícil demonstrar o que afirmo: do alto de sua prepotência, dona Dilma classificou o boato de “desumano e criminoso”. A ministra Rosário o atribuiu “à central de notícias da oposição”. O bondoso Inácio acreditou em uma ação praticada por “gente do mal” enquanto para o jurisconsulto da hora, ministro Eduardo Cardoso, a coisa foi uma “manobra orquestrada”, opinião que consubstancia a prosopopéia da indomável língua do presidente petista, deputado Ruy Falcão para quem o episódio se configura como “terrorismo eleitoral”. 

A partir daí buscou-se identificar, na oposição, o terrorista criminoso que orquestrou uma manobra típica de gente desumana e do mal. No fuxico que se estabeleceu soube-se que a Caixa Econômica Federal, por um erro de sistema, havia liberado o pagamento do benefício em desacordo com o calendário.

Confrontado com outras evidências, o banco socioestatal -- sem dúvida um símbolo de desrespeito ao cliente e ao usuário -- enrolou-se em outras tantas desculpas esfarrapadas sinalizando que estávamos, no mínimo, diante de uma brutal incompetência ou de um caso pensado no intuito de criar um fato novo capaz de derreter, aos olhos dos milhares de beneficiários do Programa Bolsa Família, a imagem dos que se opõem ao regime petista.

Meses atrás, quando o debate sobre a sucessão presidencial ganhou as ruas, a Presidente Dilma Rousseff afirmou (sic) que nas campanhas eleitorais vale o diabo. Não custa acreditar pois, numa manobra diabólica orquestrada por aloprados e marqueteiros com o objetivo de trazê-la à tona -- afogada que está na própria incompetência – e garantir índices de aprovação que fortaleçam uma próxima candidatura. Sua ida à televisão para garantir a continuidade do benefício aos necessitados eleitores é prova do que digo.

Muitas questões permaneceram no limbo da desinformação. Por exemplo: por que os saques foram liberados fora do cronograma? A CEF avaliou a possibilidade de falta de numerário nas máquinas de autoatendimento durante o final de semana fatídico? A decisão sobre a antecipação do pagamento partiu de seu intestino diretivo? Quem propagou o boato do encerramento do benefício? Esteve a Caixa Econômica comandada, no evento, por forças superiores à sua presidência, à sua diretoria? Dificil obter respostas, não é verdade? O fato é que, se houve um ponto de partida esse se localizou no banco estatal comandado pelo Partido dos Trabalhadores e não na direita capitalista, nas elites burguesas ou na oposição partidária.

Veja como são as coisas: agora entendo um fato ocorrido há quase quatro anos e que me intrigava sobremaneira. No segundo semestre de 2009 a Caixa Econômica Federal embarcou na fama da pouco confiável Norminha, personagem da novela Caminho das Índias da Rede Globo e lançou um comercial -- amplamente veiculado -- animado por uma música da banda Calcinha Preta que servia de trilha sonora para a personagem novelística. 

“Você não vale nada, mas eu gosto de você, você não vale nada, mas eu gosto de você”...insistia a peça publicitária da CaiXa, numa rara demonstração de honestidade e autocritica.

Ou teria sido, tão somente, um ato falho? 

(*) André Carvalho não é jornalista, é "apenas" um cidadão que observa as coisas do dia-a-dia. Um free lancer. Ou segundo sua própria definição: um escrevinhador. Seus sempre saborosos textos circulam pela web via e-mails.