quinta-feira, 19 de maio de 2011

Oh! Os asnos


Por André Carvalho (*)
Em 17 de maio de 2011
btreina@yahoo.com.br



OH! OS ASNOS
Com atraso razoável, como é característica das obras da Copa, do PAC e também um pouco meu costume, e não havendo nada mais interessante e atual que me venha à mente, comento o treze de janeiro de dois mil e onze, segunda quinta feira do referido mês e dia da lavagem das escadarias – e só das escadarias – da igreja do Senhor do Bonfim, na antes bendita cidade do Salvador. A lavagem se dá uma vez a cada ano, de sorte que podemos concluir, no mais raso dos raciocínios, que, ou sujamos pouco ou aquilo vive uma imundice. O Pároco e o Cardeal devem fazer outra análise, o que agora não vem ao caso.

Com clima ameno para o verão e sem a incidência de chuvas torrenciais, desde cedo, parte miúda dos habitantes e dos turistas – percentualmente falando – se deslocou para a cidade baixa em busca de proteção e diversão ou, em casos raros, para agradecer bênçãos alcançadas. Nem me passou pela “telha” agradecer a benção pelo fim do governo Lula, o que faço agora: Obrigado Senhor!

À festa acorreram, como em anos passados, além de turistas e soteropolitanos, hordas de políticos, partidariamente agrupados, fantasiados em cores e símbolos tais, como se estivessem em suas não menos festivas e imundas convenções. Cartazes, faixas, “banners” compuseram o cenário pecaminoso, se considerarmos os sete pecados capitais.

Vaidade, inveja, ira, preguiça, avareza, gula e luxúria lá estavam, com menor incidência do quarto pecado, pois que na Bahia ninguém tem preguiça de ir à festa. A avareza circundou por entre aqueles que comem e bebem, mas não querem rachar a conta. São muitos, estes...

Inúmeros lá estiveram, principalmente os funcionários públicos em cargos de comissão, apenas para inflar o derredor do chefe e para ser visto, numa tecnicidade empregatícia de quem arredonda ou abaúla o salário, via comissionamentos.

Alimentaram o embalo um sem número de ambulantes comercializando da mais pesada droga ao acarajé, embutido aí nesse cardápio a cerveja, quinto maior símbolo da festa, atrás apenas do santo, do governador, das baianas e do jegue. Não tenho registro da presença da Vigilância Sanitária, mas certamente trata-se de um lapso de informação visto que seus prepostos andam, diligentemente, dia e noite, por toda a cidade, principalmente nas praças de alimentação a céu aberto.

E por falar em jegue, durante os dias que antecederam o regozijo, não se disse outra coisa. Num pitoresco “to be or not to be; that's the question” a Bahia discutiu a conveniência da participação dos jegues na fanfarra. Podem ou não podem ir à festa, os jegues? Vão a trabalho ou a passeio?

A Sociedade Protetora dos Animais, a Justiça em algumas de suas instâncias e a Prefeitura, além é claro, dos donos dos burregos, se engalfinharam “de focinho a rabo” nessa disputa de poder, dinheiro e imbecilidade, trocando patadas de intensidades diversas.

Através dos estudos de Charles Darwin sabemos, há mais de um século, que jumentos, jegues e asnos são animais de tração e carga e mantêm sua compleição por conta desse trabalho, realizado, via de regra, sob as mais rigorosas condições. Foi um deles que carregou Maria, grávida do menino Jesus, de Nazaré a Belém, sob sol inclemente e território pouco auspicioso.

Ocorre que, atualmente, o jegue, pelo menos aqui em Salvador, não pode se dar a qualquer esforço maior, mormente os carnavalescos. Levando-se em consideração a comprovada lei do uso e desuso creio que se mantivermos os burregos longe dos carregamentos, atrofiaremos seus membros, exceto um deles, e os transformaremos, quem sabe, em mamutes sem tromba.

Que Deus vos proteja, oh asnos de toda natureza!

(*) André Carvalho não é jornalista, é "apenas" um cidadão que observa as coisas do dia-a-dia. Um free lancer. Ou segundo sua própria definição: um escrevinhador. Seus sempre saborosos textos circulam pela web via e-mails.