segunda-feira, 11 de abril de 2011

A língua portuguesa paga o pato!

Por André Carvalho (*)
btreina@yahoo.com.br
Em 01 de abri de 2011



FIRULA, FLOREIO, RODEIO E CIRCUNLÓQUIO.

É de bom alvitre começar por dizer que o título deste arrazoado é composto de sinônimos, ao gosto de Aurélio Buarque de Hollanda, o que me exime, pois, de responsabilidades circundantes ao uso e distribuição deles, os tais vocábulos, e das firulas daí advindas, pareçam elas intencionais, circunstanciais, necessárias ou não. Inicio com delongas e perífrases, posto não haver nada mais intrínseco ao que virá abaixo, espero...

Por conta de um circunlóquio verbal “entrevistatório” sobre uma firula operacional posta em prática por sua corporação, o coordenador de operações da Polícia Rodoviária Federal, inspetor Álvaro Simões, foi exonerado do cargo, levando consigo num “tsunami” ético o diretor geral que, num ato pouco comum entre nós, assinou sua carta de exoneração por razões de foro íntimo – leia-se quebra de confiança – decisão aceita pelo Ministro da Justiça, num evento com floreio televisivo.

Falo em “tsunami” ético porque, como sabemos, as ondas de um maremoto vêm, cobrem um espaço e o que aí houver, e voltam, de maneira que não devemos, por analogia, esperar da ética, sua permanência por sobre nosso país, nossos políticos, servidores e povo.

Na entrevista em que, por assim dizer, assinou sua sentença de morte o inspetor afirmou que “firula” é um jargão interno da corporação para caracterizar operações em que o volume de efetivo aplicado e/ou as ações desenvolvidas sinalizam “zelo”, mesmo este não havendo, aos olhos da sociedade. Falava, na ocasião, das operações multi-polícias nos morros cariocas. Sua verdade irritou os poderosos e mobilizou desvalidos como eu.

Sem rodeios, concluo que a firula está mesmo presente na atuação da gloriosa Polícia Rodoviária Federal. No Ceará, em 2006, seu superintendente, que somente no tsunami ético de agora foi exonerado, pediu aos comandados mais tolerância na aplicação de multas a parlamentares, autoridades e empresários, tidos como parceiros. Foi além. Numa firula sutil, solicitou “urbanidade nas abordagens” realizadas pelos policiais. Urbanidade, no caso, me remete a salamaleque, mesura e rapapé.

O Brasil ficou surpreso com tais fatos. Sinto vos dizer que nada enxergo de novo ou dificultoso. Somos o país do futebol onde a firula é muito bem vinda. Taí Neymar e Robinho que não me deixam mentir. Pela história passaram Garrincha, Edu, Denílson, Mário Sergio e o famosíssimo Gajé, amado atacante do glorioso esquadrão de aço, o Esporte Clube Bahia. Haja rodeio, haja floreio! Não fico apenas no futebol. Vamos ao boxe: alguém mais “firulento” que Popó, mais “circunloquial” que Maguila, nossos campeões mundiais? E no carnaval, para que firula maior do que mestre sala e porta bandeira?

De uns tempos para cá transformamo-nos, eu sei, na pátria dos grandes estadistas. Então vejamos: alguém fez mais firula, no palanque e no gabinete, que o Inácio da Silva? E o Collor, correndo atarantado pelas ruas de Brasília, vestindo camisetas temáticas como se em seu peitoral estivesse a solução para o Brasil? Ainda no âmbito político: Lembram-se do mensalão, aquela roubada que “firulicamente” nem existiu? Algum floreio maior que discurso do Sarney? E Supla, o senador seresteiro de plenário, alguém aí rodeia mais que ele?

Por fim, que dizer dos pareceres? Em todos, desde aqueles oriundos da mais insignificante instância aos elaborados no hermenêutico ambiente do Supremo Tribunal Federal, o que mais lemos, vemos e ouvimos são firulas. Jurídicas é bem verdade, mas firulas. Desnecessárias certamente, mas firulas. Os floreios, estes os encontramos nas mais diversas petições, peçam elas qualquer coisa, o que, na maioria das vezes, nem cabe pedir.

Convenhamos: os políticos, jogadores de futebol, pugilistas, advogados, juízes, sambistas e o conjunto da sociedade – isso para me livrar de queixas corporativistas – começaram com esse negócio da firula, e agora, o pobre do inspetor é que perde o emprego?

Cazuza, outro “firulico”, cantava assim: Brasil mostra sua cara...


(*) André Carvalho não é jornalista, é "apenas" um cidadão que observa as coisas do dia-a-dia. Um free lancer. Ou segundo sua própria definição: um escrevinhador. Seus sempre saborosos textos circulam pela web via e-mails.